Trump X Biden - a força de um é contar com a fraqueza do outro
Primárias em New Hampshire praticamente decidem candidato republicano, definindo uma repetição das eleições de 2020 em um cenário mais melancólico
Donald Trump será o candidato do Partido Republicano à Presidência dos Estados Unidos. Após a desistência de Ron DeSantis, com a disputa se tornando uma corrida de dois candidatos, a ex-embaixadora da ONU e ex-governadora da Carolina do Sul Nikki Haley precisava da vitória em New Hampshire, sua melhor chance entre os estados na disputa pela indicação do partido.
Com pouco mais de 91% das urnas apuradas, ela tinha 43,1% contra 54,6% de Trump. A diferença é menor do que indicavam as pesquisas e, em seu discurso, ela tentou fazer da derrota um triunfo, atacando de forma mais contundente seu adversário e buscando realçar aquilo que diversas sondagens mostram: seria a republicana com mais chances de derrotar Joe Biden. “O primeiro partido a aposentar seu candidato de 80 anos será o partido que vai vencer esta eleição”, disse ela, que tem 52 anos, em referência ao ex-presidente (77), e ao atual (81).
New Hampshire era a melhor possibilidade de vitória da candidata por ser um estado moderado, onde a participação de independentes, ou seja, não filiados ao Partido Republicano, era permitida. E eles participaram. Tanto que foram responsáveis por 70% dos votos de Haley, segundo pesquisa de boca de urna feita pela CNN. No total, mais eleitores não republicanos votaram nesta terça-feira do que registrados. Segundo o levantamento, foram 47% de integrantes da legenda (foram 55% em 2016), com 45% de independentes e 8% de democratas. Mesmo assim, não foi o suficiente para ela.
A partir de agora, Haley terá um mês para tentar reverter a enorme desvantagem que tem contra Trump na Carolina do Sul, algo em torno de 30 pontos percentuais, de acordo os levantamentos feitos neste início de ano. Pode desistir mesmo antes, conforme a vontade de seus doadores, até para evitar uma derrota vexatória em seu próprio estado.
Calcanhar de Aquiles
Mas se New Hampshire só confirmou o que Iowa já havia mostrado, que Trump é dominante no Partido Republicano, também evidencia suas principais fraquezas. Para vencer as eleições, Trump precisará de parte dos votos dos independentes, decisivos em boa parte dos estados.
New Hampshire mesmo é um exemplo. Lá, em 2016, o republicano foi derrotado por uma margem estreita. Hillary Clinton teve 46,8% e ele, 46,5%. Já em 2020 a diferença a favor de Joe Biden foi bem maior, 52,7% a 45,4%. Mais do que conquistar eleitores de fora da legenda, Trump teria que consolidar seu apoio entre os integrantes do partido. São 38% os que se disseram insatisfeitos caso ele seja nomeado como candidato republicano.
Outro resultado também traz um sinal de alerta para a campanha do ex-presidente. Assim como em Iowa, Trump tem dificuldades no estado entre aqueles que possuem curso superior (maioria das pessoas aptas a votar nos Estados Unidos), perdendo neste segmento para Haley por 56% a 41%. A diferença, ali, foi compensada por uma vitória expressiva entre aqueles que não são graduados (66% a 32%), cenário que pode não se repetir em alguns estados-chave.
Biden vence sem estar nas urnas
Depois de uma disputa interna do Partido Democrata sobre a data das primárias, o Comitê Nacional da sigla decidiu que a eleição em New Hampshire não contaria oficialmente para o envio de delegados. Mesmo assim, o estado fez a eleição e, sem Joe Biden na cédula, uma campanha para que seu nome fosse inscrito pelos eleitores foi vitoriosa. Assim, o atual presidente venceu com 51,5%, seguido pelo congressista Dean Philips, com 19,8%, e pela escritora Marianne Williamson, com 4,7%.
É um resultado simbólico, mas sepulta uma preocupação inicial do estafe do presidente, que iniciou uma discreta campanha para que os eleitores escrevessem seu nome com receio de que ele pudesse ser derrotado por Philips. Biden agradeceu aos eleitores do estado: "Agora está claro que Donald Trump será o candidato republicano. E minha mensagem ao país é que o que está em jogo não poderia ser maior".
Os democratas não acharam de todo ruim a vitória do ex-presidente entre os republicanos. Se, por um lado, seria interessante para eles enfrentarem um candidato desgastado por uma disputa acirrada pela nomeação, por outro, o fato da candidatura ter sido decidida mais cedo pode dar o gás que falta à candidatura de Biden, que ainda não empolgou os integrantes da legenda. A possibilidade de uma nova gestão do bilionário na Casa Branca seria o combustível ideal, assim como foi em 2020.
Afinal, falta hoje a Biden o que sobra para Trump: mobilização. Pesquisa realizado pelo USA Today/Suffolk University Poll, divulgada no início de janeiro, aponta que 44% dos apoiadores de Trump descrevem-se como no nível “10” num termômetro que mede o entusiasmo, enquanto entre votantes de Biden, menos da metade desse número, 18%, se autodenominam na mesma escala.
O mesmo levantamento mostra que o democrata tem perdido apoio em segmentos que foram fundamentais para sua vitória há quatro anos. Ele conta com apoio de 63% dos eleitores negros, forte queda em relação aos 87% que obteve em 2020. E está atrás de Trump entre os eleitores hispânicos por cinco pontos percentuais, 39% a 34%. Em 2020, o atual presidente superou o republicano neste grupo demográfico de por 65% a 32%.
Com mais intensidade a partir de agora, os Estados Unidos verão uma disputa de rejeições entre ambos. Com Trump na corrida à Casa Branca, cresce o nível de imprevisibilidade de como será travado o embate, mas o que já se sabe é que a maioria do eleitorado votará não com a esperança de dias melhores, mas para afastar o que considera ser um panorama ainda pior para um país que vem decaindo há anos, tanto do ponto de vista do bem-estar socioeconômico como no papel de protagonista no cenário global.
Foto de capa: Elvert Barnes/Flickr (CC BY-SA 2.0)